Quando este convite surgiu o meu primeiro pensamento foi: "há tanto para se escrever, que tema vou escolher?" e lembrei-me de uma época da minha vida hoteleira em que saíamos dos nossos turnos, cansados, exaustos, desmotivados, outras vezes contentes, injustiçados e ali na mesa de um café perto do hotel tínhamos as soluções para tudo, resolvíamos todos os problemas, refletíamos sobre a operação do dia e aquilo que teríamos feito de forma diferente. Discutíamos horários, tarefas, decisões e comportamentos, e tudo nos parecia tão fácil de solucionar.
Hoje, à distância de alguns anos confirmo que as decisões e soluções não são assim tao simples como fazíamos crer.
Foquei-me então nas minha equipas e nos problemas atuais que enfrentam, para que este artigo fosse também pensado nelas.
Um desses temas está relacionado com a expectativa do cliente. Hoje em dia a qualificação que os clientes fazem devido ao avanço tecnológico e o fácil acesso à informação e aliado à perceção do valor pago, é bastante superior ao que era há alguns anos. Sobretudo na capital, onde há uma tendência de preço cada vez mais alto, muito relacionado com a lei da procura e oferta, leva a que haja um esforço grande por parte das operações para que este valor faca justiça áquilo que encontra. Para isso é necessário a operação acompanhar da melhor forma, com serviço, esta subida de preço.
Esta perceção de preço por parte do cliente é distinta daquele que encontrávamos há uns anos, este cliente, que como referi chega qualificado, mais informado, com maior necessidade de viajar devido à pandemia, e com um value for money muito superior. Impulsionado muitíssimo pela situação pandémica que nos fez priorizar mais os momentos de lazer e família, mas também a uma maior necessidade de gestão do budget familiar. Agora, o cliente ambiciona uma experiência de qualidade mais abrangente desde o momento da reserva até ao check out.
O cliente deixa de procurar apenas aquilo que viu online, procura o fator diferenciador, busca na estadia algo que marque a viagem, que o faça recomendar e querer voltar, procura a experiência, e é neste sentido que devemos caminhar, de deixar uma marca e um desejo de regressar. E isto não e alcançado com um amenitie, um vip, uma água ou um turndown, é preciso criar outros elementos dentro dos hotéis para ajudar a criar valor, atividades, programas, experiências e vida dentro do hotel, para que o impacto seja sentido logo na chegada e proporcionalmente um retorno no valor gasto.
Não são já relevantes as estrelas que estão colocadas na entrada do hotel, importa a experiência com que o cliente sai, pois é essa avaliação e feedback que nos vão posicionar. Cada vez mais a tendência é ter bons 3 e 4 estrelas com um serviço muito superior.
Além do ponto relativamente ao serviço, que será aquele que abordaremos, existem atualmente outros pontos em crescimento para alavancar a expectativa do cliente, nomeadamente no que diz respeito à responsabilidade ambiental, à segurança, que felizmente é uma mais-valia em Portugal e a eficácia do check in. Que deixaremos para um outro reflexão.
Diretamente relacionado com a perceção de preço/expectativa do cliente, é a formação das equipas e as necessidades de recrutamento que enfrentamos, que embora apresentem uma taxa de sucesso superior à do pós-pandemia, ainda são um dos grandes desafios atuais.
Muitos dos profissionais do sector abandonaram a hotelaria, na expectativa de alcançar uma melhor qualidade de vida, através de melhores condições salariais, melhores horários, menor pressão, com mais condições, com perspetivas de evolução na carreira, deixando desta forma o sector menos qualificado e com uma dificuldade de contratação imensa, redobrando o trabalho das equipas que permaneceram, quer em termos de formação de novos elementos como no desempenho das tarefas diárias.
É preciso refletir sobre como vamos trabalhar com aquilo que o mercado nos oferece atualmente: trabalhadores sem formação, sem experiência hoteleira em que grande parte das vezes a sua mais valia são as soft skills, e em simultâneo integrá-los nesta função de gerir a expectativa do cliente.
A mudança tem de começar por dentro, com uma dinâmica diferente de RH, com planeamentos de carreira, com estruturação de objetivos, formação agregada a contratos de permanência, pois muitas vezes é feito o investimento em formação de colaboradores que ao fim de 3/4 meses voltam ao mercado, já mais qualificados é certo, mas num investimento feito por nós do qual não obtivemos retorno, continuemos ainda com a criação de prémios de produtividade, por anos de permanência na empresa, por estabelecer parcerias com empresas que sejam realmente úteis ao dia-a-dia dos colaboradores, acrescentar pequenas formações ao longo do tempo mais vocacionadas a soft skills, como a gestão de equipas, de reclamações, liderança, grooming.
Outro ponto a ser explorado é a criação de dinâmicas de team building, para criar união nas equipas, são um fator que reflete na permanência das equipas, pois nem sempre as coisas desenvolvem da forma que gostaríamos, mas ter um bom ambiente de trabalho, uma boa relação com a equipa e com a chefia direta, gostarmos de ir para o nosso local de trabalho, é um fator importante na conservação das equipas e na longevidade das mesmas.
Não menos importante é também a criação de bons planos de estágio, o retorno futuro é bastante favorável com alunos a divulgarem os hotéis onde estão inseridos sendo um excelente veículo de divulgação, assim como a aposta em parcerias com instituições educacionais e escolas de hotelaria para recrutar estudantes e jovens profissionais.
Em suma, temos como desafio a melhoria da perceção do cliente, que pode ser aliada a novas contratações que trazem uma visão diferente e por vezes inovadora, que trazem como fator diferenciador as soft skills, mas que necessitam de acompanhamento e um plano de RH bem definido para que se tornem elementos validos na estrutura.