É-me difícil escrever para a indústria ao lado de profissionais de carreira, com formação de base, experiência e passagem por vários departamentos de um hotel, mesmo assim decidi arriscar porque não é todos os dias que um director financeiro tem a possibilidade de tomar a decisão última na gestão de um hotel. Durante a minha vida profissional fui-me habituando a pesquisar e compreender os negócios e, essa curiosidade levou-me a ser ouvido por chefias, administradores e líderes de algumas das sociedades empresariais com quem me cruzei.
Não podia ser diferente quando, em 2014, embarquei no então “maravilhoso” mundo da Hotelaria. “Diferente” das restantes áreas de negócio e “muito” mais exigente. Foi a medo que entrei, no entanto, a facilidade de me ambientar a equipas e pessoas facilitou o processo. Tive a sorte de trabalhar e chefiar directamente colegas que se transformaram em amigos, rapidamente transformando o receio inicial num amor último. Daquele que sobrevive à paixão inicial.
Durante dez anos tentei absorver o máximo possível da operação, dos bastidores e habituei-me a ver o sorriso na cara dos clientes satisfeitos.
Em dez anos ganhei competências e fui-me tornando num director financeiro diferente, consciente de que há custos “que têm de ser”, diferenciam um Hotel do outro. Que há processos que só podem ser “manuais” mesmo que existam ganhos de eficiência de outra forma. Em dez anos mudei bastante a minha abordagem: muito exigente com os números mas, colocando-me cada vez mais do lado do “investidor” e menos do “proprietário”.
Um hotel só pode ser referência se se reinventar, e continuar a investir na equipa, nos equipamentos, nas redes sociais (esse mal necessário que daria para mais uns textos).
Num mundo em que um vírus informático afeta a vida de milhões, o sorriso de um colaborador pode fazer a diferença. Sem ataques da Crowdstrike…está sempre aqui, a procurar fazer o seu melhor para que o cliente que tem uma dificuldade sinta um apoio, um conforto.
Esse é o fascínio da Hotelaria que ainda me cativa. Saber que, tal como num hospital estamos a salvar vidas, à nossa maneira (basta pensar que fazemos parte do hospitality business). Ao contrário do que receava não é mais exigente do que outra área de negócio, se for encarada com profissionalismo, mas é de facto diferente e em dez anos mudou.
O Planeta tornou-se mais pequeno, viajar entrou no mindset do mundo e Portugal transformou-se num destino, por méritos próprios mas, também, beneficiando da sua “neutralidade”, longe de zonas de conflito, “perto” do coração da Europa para quem nos visita do outro lado do Atlântico. Mudou o perfil do cliente, mudou a competição e mudaram as gerações que foram entrando no mercado.
É cada vez mais difícil contratar, seja pelo êxodo durante a pandemia, seja pelo número de hotéis que nasce a cada mês. Competição recomenda-se, mas o país e a indústria deviam ter antecipado as necessidades. Mais cursos técnicos e menos de gestão, melhores salários e acima de tudo o devido reconhecimento que a indústria merece com apoios permanentes à contratação e uma maior fiscalização da economia paralela que ainda assola o Turismo e por arrasto os hotéis, de porta aberta e, mais fáceis de “condenar”.
Uma política mais humana é insuficiente pelo que apostar em salários, benefícios e qualidade de vida dentro e fora das empresas é obrigatória. Um compromisso sempre difícil de alcançar quando a procura é muito superior ao recomendável. Mais do que uma luta é um desafio manter o rumo, acalmar a equipa e dar-lhes um propósito. Alguns desistiriam, mas, a indústria tem esse espírito de missão que, em alguns casos, ultrapassa o lucro fácil e, são esses projetos e valores que vingam.
Dez anos depois a personalização, o pormenor e a relação com o cliente devem manter-se como foco, principalmente em hotéis boutique ou de luxo despretensioso onde a tecnologia se deve ficar pelo BackOffice, com o cliente ansiar por um sem número de “gadgets” mas no final a valorizar o contacto. Diria que, dez anos depois, o contacto humano sai reforçado com tanta tecnologia à volta da indústria e quem o conseguir fazer estará mais perto do El Dorado quando o necessário ajuste à realidade do Turismo chegar.
Um hotel pode e deve criar experiências mas, de nada vale ter um sem número de equipamentos (ginásios, SPAs, piscinas, multimédia, tablets,etc… ) se, o primeiro e último contacto falharem.
Era assim há dez anos, será assim para os próximos dez.
A hotelaria é feita de pessoas, mas também transforma pessoas, dos clientes à equipa, passando por este financeiro que agora é Director Geral.